sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Você tem sede de que? Você tem fome de que?

Para que várias pessoas se reúnam, mesmo que com objetivos diferentes, mas com uma causa em comum, gritando e cantando, unindo vozes e transformando-a em uma só voz, que pede, clama, briga... creio que algo está errado não é? Um corpo não se movimenta quando em equilíbrio, e se agita intensamente quando o desequilíbrio é forte, ele luta pela sobrevivência. Então, por que fingir que não ouve, que não vê, que não entende tanta agitação? Por que negar certas condições visíveis a todos? 
Por que achar que estamos ainda submetidos, e que por isso nunca levantaremos nossas vozes?


Vimos na história que pessoas 'de poder' escolheram tirar vidas, calar vozes, quebrar sonhos e ossos, queimar esperanças e corpos inteiros a simplesmente tentar resolver o problema. Ainda hoje fazem isso!
Mesmo com tantos fatos que condenam nosso passado e deveriam fazer-nos refletir, não é difícil encontrar pessoas que além de não defenderem um possível diálogo, tão importante em conquistas e avanços, chegam com um discurso equivocado e estagnado, que intitula, nomeia, distribui rótulos à massa que se agita... "os arruaceiros, drogados, vândalos e insatisfeitos".
 Esses, meus caros, tenho certeza, cuidam da vida dos outros pois negam a sua própria e nunca foram capazes de lutar por nada, nem por sua própria dignidade, entregues finalmente a mídia que massifica pensamentos e manipula possíveis opiniões. A falácia é a mesma, a falta de coragem é a mesma, o comodismo é o mesmo, a cegueira social...
A conscientização das condições do ser humano deveriam servir-se para que este lutasse por mudanças, que buscasse mudar, fazer diferente, pregar a diferença... Mas o que vemos, que vergonha, são pessoas que lamentam de si, olham para o chão e voltam para sua confortável e já laceada poltrona e se permitem serem invadidos por ideias superficiais e cômodas. Triste daquele que crê não ter condições para mudar a si e ao chão que pisa. 


Portanto, os arruaceiros que bloqueiem ruas, os insatisfeitos que busquem justiça, os vândalos que quebrem e estilhacem os estigmas sociais, e aqueles denominados massivamente de drogados e desocupados que provem ter muito mais capacidade e consciência do que esses que tentam atingir com palavras cristalizantes.

 Se os famosos direitos fossem cumpridos e respeitados por TODOS, não precisariam ser nomeados, não precisariam ser pronunciados em coro pela sua falta, pois já teriam sido revertidos em AÇÕES!


Queda do estudante de Medicina na Cinelândia, Movimento Estudantil, RJ, 1968.


Para que a história nunca seja esquecida, 
Para que o futuro nunca seja ignorado,
Para que a luta nunca seja abandonada!



segunda-feira, 22 de agosto de 2011

O que lateja é a cabeça, o peito, o passo.
Os olhos que não vêem o caminho, a mão que não se apóia no abismo.
O mundo que gira independente dos nossos gritos.
Os gritos...
Doces, aos costumes dos que são calados.



Entendi que sou o que quiseram fazer de mim,
Sou só, neutra, calada, ser impessoal.
Com o andar apático, o olhar no chão, 
sorriso arrancado, forma de não compartilhar qualquer motivação.
Aprendi a temer minha imagem, a negar ajuda e a desconfiar das velhas promessas de paz.
Aprendi a não aprender mais do que o necessário para que eu fosse útil,
para que eu fosse aceita.
Aprendi a ser Normal.


A cabeça pesa e o corpo empurra.
As mãos cansam e as veias latejam.
Os pés descalços sentem o chão a roubar o que já foi calor.
Os olhos cansados correm o chão sem sustento.
A vida que acaba independente das nossas lágrimas.
O sal que nos cai, sustenta nossos dilúvios.
As amarras que criamos para nossas mudanças,
São as nossas maiores confidentes.
E os braços que tentavam dissipar qualquer dominação
Hoje almejam tudo o que no mundo fora do seu, nunca lhe pertencerão.


Quando vi tudo o que não sou, tudo o que me negaram,
A moral bateu nos meus ombros e me deixou
E eu que sempre fui só,
via-me agora só.
O frio teve mais importância, o chão ganhou justificativas,
Sempre esteve sob nossos pés, aguentando fardos.
O mundo re-virou, viraram detalhes,
Como o pingente que eu nem reparei que carregava sobre meu peito.
Como as lembranças que eu sempre neguei carregar...


Hoje,
sonho.

domingo, 14 de agosto de 2011

Poética


Estou farto do lirismo comedido
Do lirismo bem comportado
Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente
                protocolo e manifestações de apreço ao Sr. diretor.
Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário
                                                o cunho vernáculo de um vocábulo.
Abaixo os puristas


Todas as palavras sobretudo os barbarismos universais
Todas as construções sobretudo as sintaxes de exceção
Todos os ritmos sobretudo os inumeráveis

Estou farto do lirismo namorador
Político
Raquítico
Sifilítico
De todo lirismo que capitula ao que quer que seja
fora de si mesmo

De resto não é lirismo

Será contabilidade tabela de co-senos secretário do amante
exemplar com cem modelos de cartas e as diferentes
maneiras de agradar às mulheres, etc

Quero antes o lirismo dos loucos
O lirismo dos bêbedos
O lirismo difícil e pungente dos bêbedos
O lirismo dos clowns de Shakespeare

- Não quero mais saber do lirismo que não é libertação.

                                                                            
                                                      (Manuel Bandeira, Libertinagem- 1930)




Assim seja!

sábado, 13 de agosto de 2011

Problemática dualista

Há uma igreja a cada esquina
                                                            Há uma mulher a cada esquina
                              
                      Com todas as opções possíveis no mundo
                                  sacro e carnal
                    disputam sempre a mesma freguesia.



sexta-feira, 12 de agosto de 2011

Cantiga de Enganar

O mundo não vale o mundo, 
                                           meu bem.
Eu plantei um pé-de-sono,
brotaram vinte roseiras.
Se me cortei nelas todas 
e se todas se tingiram
de um vago sangue jorrado
ao capricho dos espinhos,
não foi culpa de ninguém.
O mundo,
                 meu bem,
                                   não vale
a pena e a face serena
vale a face torturada.
Há muito aprendi a rir, 
de quê? de mim? ou de nada?

(...)
                                          (Carlos Drummond de Andrade)


Sem mais!

terça-feira, 2 de agosto de 2011

Dê-lhe tempo, corpo; acalma-te, alma; esta pessoa que vos sente, olhem bem, já não sabe o que é;
o que já foi e o que pôde ser.
O mundo grita na surdina, já não pode tanto ouvir; não ouve nem a si mesma.
Anda disfarçadamente maltrapilha, procurando onde deixou a sua coberta que carinhosamente chamou de 'dignidade'.
Pede esmolas com os olhos, reza para conseguir sorrisos,mesmo que já não saiba o que fazer com estes.
Come com o coração, por dentro, tudo o que rumina, tudo o que lhe parece azedo ou amargo.
O amargo que corre nos capilares, atinge os músculos e faz-lhe esticar-se, como um corpo estranho que é seu corpo.
Sorri por não saber o que fazer, oferece-o com o medo de que lhe exijam muito mais e além.
Quando sente-se sinceramente e profundamente mal, não pode repelir-se, já não se desprende de seu próprio mal.
Esta pessoa que vos sente fala da vida, imagina futuros, mas onde está ela nisso tudo?
O espelho não reflete mais quem ela conhece por si mesma. É alguém que a olha fixamente para depois desviar e desistir de se procurar ao menos externamente.
Vomita para dentro, tudo o que queria vomitar e oferecer ao externo, deixando-lhe dissipar no ar.
O corpo estranho treme, engana-se com o frio. Começa a suar, 'é o cansaço, essa possibilidade de esquentar'.
Suas mãos espalmam-se de modo sutilmente rude. No fundo ela só queria se acabar um pouco. Por fora tudo grita 'desista'.
Os dentes rangem, os olhos perdem-se. Busca duramente sentido no que chama de rotina.
Equilibra-se em seus próprios medos, cortantes ou simplesmente contestadores. Teme suas proprias contestações.
Teme tudo o que promete aos outros, pois já não pode cumprir as promessas feitas a si mesma.
O mundo, vezes gira depressa, vezes se estagna no ar. A cabeça roda, já não tem mais onde se apoiar...
Tudo cai...


Ela acorda, boceja, 
...
...
...
O primeiro passo é sempre o que dá mais medo,
mesmo que seja o de todos os dias.